quinta-feira, agosto 16, 2007

Alucinações à Beira Mar (Alucinações, vol. I)

Sente aí amigo, e tomemos mais uma cerveja, celebremos o novo século, este improvável monstro, sempre a nos perseguir incansavelmente. Brindemos o sol que daqui a pouco raia no horizonte, e falemos das coisas belas. O alvorecer do dia. A perfeição para nós, bêbados, filósofos do mundo moderno. Sente, a saidera não demora. Lembremos nosso tempo de criança, aqueles moleques magricelas, os joelhos ralados, os pés descalços, o mundo tão vasto, tão imenso, nada nos atingia. Lembremos a juventude, aqueles tempos loucos, tudo parecia tão fácil, e realmente o era. Cacete, ainda é, basta mais uma cerveja para acalmar os ânimos. Vede esse resplendoroso sol, que já vem nascendo. Ao contemplá-lo, lembremos também dos nossos amores loucos, os impossíveis, os perplexos amores. As agonias de glórias defecadas, a pátria nossa, amada, a puta mor. E tudo era tão claro, mas agora, nada há mais claro do que esses copos, cheios da mais pura esperança de um futuro incerto. O meu, o seu, já não como antes, mas sempre nós mesmos. Não fale tanto, não se canse. Antes de relembrarmos tantas imagens, escutemos esse solo de guitarra, que abre o dia com toda a glória que ele merece. Afinal, mais um dia significa mais cerveja, e nós, amigo, nunca paramos enquanto ainda estamos de pé. Sempre é hora de nos alegramos em nosso culto. Esse brinde a Baco. E, pelo menos por uns instantes, esquecemos quem somos, e tudo o que importa é o agora, o próximo gole, a próxima palavra dita, o próximo pensamento que jorra. Amigo, não nos conturbemos com as desgraças ao nosso redor. Tudo é tão belo, as ondas assolam a areia branca, o céu azul claro, o sol já quase nascendo, um novo século não parece assim tão terrível olhando daqui. O que importa como vai ser amanhã? Amigo, há apenas o aqui, nós, essa cerveja gelada, o glorioso sol, e mais nada. E se não houver mais amanhã? Será um belo dia. O mais belo dos dias. A certeza de um amanhã nos destrói a cada dia, a morte vindo aos poucos. Ah, um dia sem o amanhã, que glória seria, o derradeiro dia, a verdadeira humanidade viria à tona. Mas, deixemos de tanta merda. Onde estaremos quando o futuro chegar? Por aí amigo, por aí.

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